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Liberdade de Expressão, Discurso de Ódio e Controle das Redes Sociais

Faltam leis? Precisamos de censura prévia para barrar o discurso de ódio? Até onde vai o direito do cidadão em dizer o que pensa?

Liberdade de Expressão, Discurso de Ódio e Controle das Redes Sociais
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No Brasil, o sistema jurídico adotado é o da legalidade (direito positivado). Então, no nosso País, vale o que está escrito na Constituição e nas leis.

Assim, o limite das leis sempre estará previsto nas próprias leis (“lei” lato sensu), e não no que as pessoas “acham” que é certo ou errado. Não é porque minha opinião lhe incomoda ou é contrária às suas convicções, que eu tenha que ser calado. Mesmo porque eu posso querer o mesmo contra você, e você não gostaria que isso acontecesse.

Não existe “crime de opinião” no Brasil, e não existe “censura prévia” no Brasil. Se, na minha liberdade de expressão e de opinião, eu cometer algum crime, eu respondo por aquele crime. Mas eu não posso SER CALADO para “evitar cometer crimes no futuro”. Isso é totalmente contra nosso sistema jurídico. Por exemplo, o Código Penal diz: “Matar alguém: Pena – Reclusão de 6 a 20 anos”. Mas a lei não diz “prender alguém para evitar que ele mate alguém no futuro”. Se eu, no exercício da minha liberdade, decidir que quero matar alguém, e decidir que estou disposto a aceitar a pena, em um cálculo de “custo-benefício” dentro dos meus critérios e valores pessoais, eu posso decidir matar alguém, e só depois deste ato é que vou ser preso pelo crime. Mas jamais posso ser preso para evitar que eu faça isso no futuro, só porque alguém “acha” que tenho potencial para matar alguém, mesmo sem eu ter feito nada que sinalize isso.

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Logo, a ideia de cassar a palavra das pessoas, proibir a publicação de certos conteúdos e eliminar redes sociais visando evitar que as pessoas se manifestem NO FUTURO é completamente contrária ao nosso sistema jurídico. A pessoa deve exercer sua liberdade de escolha e responder pelos crimes que cometer no exercício desta liberdade.

Se eu xingar alguém, respondo pela injúria. Se eu difamar alguém, respondo pela difamação. Se eu disser falsamente que alguém cometeu um crime, eu respondo pela calúnia. Se eu ameaçar alguém, respondo pela ameaça. Se eu for racista, respondo pelo racismo. Se eu discriminar alguém, respondo pela discriminação. Se eu incitar à violência, respondo por este ato. Mas eu NÃO posso ser calado para evitar que eu faça isso no futuro, sem eu ter cometido o crime ainda.

Assim, no Brasil, pelo império absoluto da lei, eu sou livre para fazer o que eu quiser e falar o que eu quiser, mas sempre respondo pelos crimes que eu cometer ao agir ou falar. A escolha é minha. Não posso ser calado previamente para evitar que, no futuro, eu cometa quaisquer destes crimes. E eu posso ESCOLHER que QUERO praticar estes crimes, respondendo pelas consequências disso. Simples assim.

Então, é descabida a reprimenda de “você não pode falar isso” ou “você não pode publicar isso”. Posso. Tenho liberdade para fazer isso quando quiser. Se ao fazê-lo, cometo crime, respondo pelo crime. Mas não posso ser impedido “preventivamente” de fazê-lo, pelo simples fato de não existir ainda, da minha parte, um comportamento descrito na lei como crime. No Brasil, não existe punição pelo “risco de cometer crime futuro”.

As Normas Jurídicas GARANTIDORAS da Liberdade de Expressão

Dentro do nosso sistema jurídico, que é baseado na legalidade, para sabermos se algo é ou não crime, ou se algum direito está garantido ou não, temos que sempre olhar para o conteúdo das normas jurídicas vigentes. E isso não é difícil, uma simples leitura já é bastante esclarecedora e não requer nenhuma “ciência jurídica” para a perfeita compreensão do que a legislação diz.

 

Então, vamos ler a constituição e as leis.

 

O que diz a Constituição Federal, COMO GARANTIA da liberdade de expressão:

Art. 5º da Constituição Federal:

IV - É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;

XIV - É assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;

Art. 220 da Constituição Federal: A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

Parágrafo 1º - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social.

Parágrafo 2º - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.

 

O que diz a Constituição Federal, COMO CONSEQUÊNCIA da liberdade de expressão:

Art. 5º da Constituição Federal:

V - É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem.

X – São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

 

O que diz o Código Penal Brasileiro sobre CRIMES que alguém pode cometer no uso da liberdade de expressão:

Art. 138. Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime.

Art. 139. Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação.

Art. 140. Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro.

Art. 146-A. Intimidar sistematicamente, individualmente ou em grupo, mediante violência física ou psicológica, uma ou mais pessoas, de modo intencional e repetitivo, sem motivação evidente, por meio de atos de intimidação, de humilhação ou de discriminação ou de ações verbais, morais, sexuais, sociais, psicológicas, físicas, materiais ou virtuais

Art. 147 - Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave

Art. 147-A.  Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade.

Art. 286 - Incitar, publicamente, a prática de crime.

Art. 287 - Fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime.

 

O que diz o Código Penal Brasileiro sobre O QUE NÃO É CRIME no uso da liberdade de expressão:

Art. 142 - Não constituem injúria ou difamação punível:

        I - A ofensa irrogada em juízo, na discussão da causa, pela parte ou por seu procurador;

        II - A opinião desfavorável da crítica literária, artística ou científica, salvo quando inequívoca a intenção de injuriar ou difamar;

        III - O conceito desfavorável emitido por funcionário público, em apreciação ou informação que preste no cumprimento de dever do ofício.

 

O que dizem outras leis, sobre CRIMES que podem ser cometidos no uso da liberdade de expressão:

Lei 7.716/1989

Art. 2º-A. Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, em razão de raça, cor, etnia ou procedência nacional.

Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.

Parágrafo 1º. Fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo.

Art. 20-C. Na interpretação desta Lei, o juiz deve considerar como discriminatória qualquer atitude ou tratamento dado à pessoa ou a grupos minoritários que cause constrangimento, humilhação, vergonha, medo ou exposição indevida, e que usualmente não se dispensaria a outros grupos em razão da cor, etnia, religião ou procedência.

 

O QUE DIZEM A CONSTITUIÇÃO E AS LEIS SOBRE CALAR ALGUÉM E IMPEDIR QUE ESTA PESSOA SE MANIFESTE SOBRE O QUE ELA QUISER SE MANIFESTAR PUBLICAMENTE:

Nada...

 

O Combate ao “Discurso de Ódio”

Muitos afirmam que a liberdade de expressão não é absoluta e que as manifestações das pessoas deveriam ser limitadas, para combater o “discurso de ódio” nas redes sociais. “Discurso de ódio” é uma expressão marqueteira, gourmetizada e ideológica que foi adotada pelos “intelectuais de esquerda” para dizer a mesma coisa que a lei já diz há anos: quem expressa sua opinião e comete um crime com este ato, responde pelo crime cometido. Isso existe desde que o Brasil era colônia...

O problema (e obviamente que esse problema é intencional e de caso pensado) é que “discurso de ódio” é uma expressão vazia que não significa nada do ponto de vista jurídico, mas pode ser usada para justificar uma série de ilegalidades e perseguições.

Quem xinga, odeia? Quem é racista, odeia? Quem discrimina, odeia? Quem acusa de crime, odeia? O que “ódio” tem a ver com um comportamento objetivo escrito na lei? Ódio é um sentimento subjetivo e impossível de qualificar, de descrever ou de provar. É o mesmo que tentar definir o que é amor...

Quais são os sintomas visíveis ou comportamentos reais de alguém que demonstra “ódio”? Não gostar de alguém é ódio? Não concordar com alguém é ódio? Ser contra o comportamento de alguém é ódio? Ser contra a opinião de alguém é ódio? É possível sentir ódio sem demonstrar isso com um comportamento visível? É possível agir como quem odeia sem odiar realmente? Isso simplesmente não faz o menor sentido prático, mas se convencionou usar esta expressão para significar que o comportamento da outra pessoa é reprovável, coisa que a lei já faz há tempos... Não tem novidade nenhuma nisso. É só discurso ideológico, mesmo.

É comum encontrar pessoas adotando a comparação do chamado “discurso de ódio” que supostamente existe na sociedade contra certas minorias ou os chamados “grupos vulneráveis”, à propaganda nazista, que trazia um discurso de ódio ao povo judeu.

Em primeiro lugar, JAMAIS compare a perseguição nazista aos judeus a absolutamente NADA que ocorre ou ocorreu com qualquer outra minoria que se queira defender. NUNCA, mas NUNCA MESMO diga que algo é comparável ao holocausto, sob pena de normalizar, banalizar e minimizar esta atrocidade que maculou a história da humanidade, o que é absolutamente inadmissível e ultrajante.

O que é claro e cristalino no nosso sistema jurídico é que a Constituição e as leis já fazem muitíssimo bem o papel de proteger todos os cidadãos – e não apenas as minorias ou grupos vulneráveis, mas também todos eles – contra ofensas, discriminação, racismo, perseguição, ameaças, agressões verbais ou físicas, ou o que for.

Desde sempre, é só invocar as leis já existentes, para que aquele que comete crimes no exercício da sua liberdade de expressão – ou liberdade de ação – responda pelos crimes cometidos. E se o fizer de novo, responde de novo. Até aprender ou cansar. “Discurso de ódio”, repito, é expressão vazia, genérica, imprecisa e não se presta ao uso técnico-jurídico. Ou o comportamento é descrito na lei como crime e o autor responde pelo crime, ou não é crime e não há consequências, por mais que tal comportamento desagrade a quem quer que seja.

 

A Regulação das Redes Sociais Seria Benéfica para a Sociedade?

Talvez isso seja a coisa mais desejada de certos grupos, atualmente, no Brasil. A “regulação” das redes sociais, para existir, obvia e certamente exigirá que alguém – pessoa ou grupo de pessoas –, em algum momento, decida o que pode ou não pode ser dito ou publicado. Este alguém terá o poder de escolher aquilo que convém e não convém, o que é permitido ou proibido, o que pode ou não pode ser dito. É óbvio que esta pessoa será colocada na condição de censor do discurso alheio. Quais serão os parâmetros deste controle da liberdade de expressão? Como será exercido este controle? Será um controle prévio ou posterior à postagem? E quem controlará o controlador? Qual a possibilidade de isso descambar para perseguição pura e simples contra “aquilo que eu não gosto de ouvir” ou para apagar “ideias contrárias às minhas”? Alguém, em sã consciência, acha mesmo que controle de conteúdo em redes sociais fará mais bem do que mal à sociedade?

As redes sociais são a maior conquista da humanidade neste século. Elas deram voz ao oprimido, deram informação ao enganado, deram apoio ao desolado, deram ouvidos para quem gosta de falar e deram bocas para quem gosta de ouvir. Graças às redes sociais, a mídia mainstream não detém mais o monopólio da informação e não possui mais o poder de decidir o que a sociedade deve saber e com qual abordagem essa informação deve ser divulgada. Redes sociais se tornaram a libertação das opiniões represadas, a vitrine das ideias nunca compartilhadas e deram às pessoas comuns o poder de dizer “concordo” e “não concordo”. E isso é maravilhoso para uma democracia.

O que se pretende, na verdade, com essa ideia de controlar conteúdo de redes sociais, é exercer o poder de calar alguém sumariamente, sem que esta pessoa tenha o direito ao contraditório e à ampla defesa, pela mera decisão de alguém que escolhe apertar um botão e imediatamente calar uma boca. Por necessidade ou capricho, tanto faz.

Não é assim que funcionam as coisas em um Estado Democrático de Direito. Apenas o Estado-Juiz pode me punir, após ouvir meu acusador, minha vítima e minha defesa. Sair deste “devido processo legal” para censurar o pensamento alheio é flertar com uma ditadura que impõe uma opinião em detrimento da outra.

Por isso eu prefiro o império da lei. Fale o que quiser, como quiser, quando quiser, onde quiser, e responda pelos crimes que cometer. Para crimes no exercício da liberdade de expressão, o censor é a própria lei. Ninguém deve assumir essa posição no lugar da lei.

Ninguém, na condição de humano, têm capacidade para decidir entre o certo e o errado em relação aos seus semelhantes. Apenas cabe ao Estado de Direito fazer isso. E há regras. Faz tempo que há regras. Não é por falta de regras que se quer criar o controle das redes sociais. É por interesses obscuros e inconfessáveis. E muitos desavisados seguem apoiando essa proposta estapafúrdia.

O que estão tentando insistentemente, na verdade, é contornar o Estado-Juiz para exercerem o poder de calar quem lhes desagrada, sem maiores delongas e sem contestações. O poder pelo poder.

"O inferno são os outros". Jean Paul Sartre

"Democracia é quando eu mando em você. Ditadura é quando você manda em mim". Millôr Fernandes

Por Anderson Rocha - Advogado em São Paulo

Fonte/Créditos: Autor: Anderson Rocha, Advogado em São Paulo.

Créditos (Imagem de capa): https://appsindicato.org.br/wp-content/uploads/2019/09/constituicao-rasgada.jpg

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Dr. Anderson Rocha

Publicado por:

Dr. Anderson Rocha

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